Dia Um
   
 
 
 

Quantos somos?

Há nosso "eu" animal, que anseia e deseja desnudar suas presas quando seu campo está ameaçado; nosso "eu" emocional, que ama e teme, exulta e agoniza; nosso "eu" intelectual, que apreende e analisa e contempla os outros "eus" com um distanciamento presunçoso; nosso "eu" espiritual, que se empenha e anseia, adora e venera. Há o "eu" que você era aos oito anos, e o "eu" que será aos oitenta. Há o "eu" que fui na terça-feira, dia 11 de setembro, quando acordei de mau humor, fui áspero com meus filhos, acovardei-me perante meu chefe, apunhalei meus colegas de trabalho pelas costas e desliguei o telefone na cara de minha sogra; há meu "eu" de amanhã, quando serei carinhoso com minha família, respeitoso mas firme com meu chefe, e gentil, justo e atencioso com todos.

Como podemos sequer imaginar que no conglomerado de células, órgãos e membros a que chamamos de nosso "corpo", expandindo-se pelas elevações e depressões do terreno a que chamamos "tempo", lá resida um singular e único "eu"?

Mas de alguma forma estamos convencidos disso. Não podemos identificá-lo ou descrevê-lo, nem nossa vida do dia-a-dia o reflete. Mas sabemos que está ali. O que significa que é; de outra forma, de onde mais brotaria este conhecimento?

Um único "eu" significa que as nossas personalidades - animal, emocional, intelectual e espiritual - têm uma fonte e um objetivo em comum. Significa que todos os momentos de nossa vida estão interligados: aquilo que somos hoje e aquilo que faremos amanhã é a soma e resultado daquilo que fomos e fizemos ontem e no dia anterior. Um único "eu" significa que o passado é redimível. Um único "eu" significa que podemos conseguir harmonia em nossa vida.

A Torá refere-se ao dia de Yom Kipur como achat bashaná, "uma vez por ano". Mas as palavras hebraicas achat bachaná também podem ser traduzidas como "o um do ano". Yom Kipur, explicam os mestres chassídicos, é o dia em que nossa unicidade intrínseca aflora à superfície.

Por 364 dias no ano, os fragmentos de nossa vida e personalidade estiveram dispersos pelas câmaras de nossa alma e disseminados pela vastidão do espaço e do tempo. Em Yom Kipur, estamos habilitados a uni-los com sua fonte e dirigi-los rumo à sua meta.

   
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