Vida após a morte
  Por Yanki Tauber; baseado nos ensinamentos do Lubavitcher Rebe
 
 
 

A vida como a conhecemos se estende além da morte? Isso depende daquilo que considera vida. Se a vida, para você, é conseguir o máximo que puder de seus recursos para si mesmo, você tem um tempo limitado no qual conseguir o máximo que puder, e então fecham-se as cortinas e acaba o espetáculo. Se vida, para você, significa fazer uma diferença na vida do próximo, então você viverá para sempre.

Os fatos relatados na porção Chayê Sará da Torá ocorrem todos após a morte de Sará. Não apenas isso - eles parecem todos sublinhar o fato da sua morte. Primeiro lemos sobre o sepultamento de Sará na Gruta Machpelá em Hebron. A seguir, temos a história da escolha de Rivca (Rebeca) para esposa de Yitschac e de como ela tornou-se a matriarca da família de Avraham em substituição à Sará. A Torá então relata o retorno de Hagar - a quem Sará havia banido da casa de Avraham.

Mesmo assim, Chayê Sará significa "a vida de Sará" ! De que maneira isso pode se reconciliar com o conceito de que o nome de uma porção da Torá expressa seu tema e mensagem essenciais

     
 
     
 

Ocorre que muitas pessoas crêem na vida após a morte. Duas pesquisas levadas a cabo pelo Instituto Gallup concluíram que 79% dos americanos acreditam que depois que morrerem suas almas serão julgadas e mandadas ao céu ou ao inferno, e que 33% acreditam em fantasmas. Uma pesquisa pela Internet nos informa que 38% dos participantes crêem em reencarnação (embora apenas 26% ache que eles mesmos merecerão este privilégio).

A mensagem destas pesquisas não está muito clara. Ao mesmo tempo em que demonstram um certo otimismo quanto à continuidade de nosso precioso "eu", sugerem também que nossa existência atual está fadada à obsolescência. Podemos viver como uma aparição fantasmagórica, ou ainda como o gato da vizinha; mas até um certo ponto, o senso comum concorda que a vida, como a conhecemos, chegará a um final.

A tradição judaica fornece um cenário mais encorajador. Embora o conceito judaico da vida futura inclua céu e inferno (mesmo que muito diferentes daqueles clubes de campo nas nuvens e fornalhas subterrâneas retratados nas caricaturas da imprensa), a reencarnação e mesmo dibuc, sua característica central é techiyat hametim, a vivificação dos mortos. Techiyat hametim declara que na era messiânica nossas almas serão devolvidas a nossos corpos ressurrectos. Em outras palavras, a vida com nossa própria alma habitando nosso próprio corpo - basicamente a vida que conhecemos atualmente - prosseguirá.

Porém os sábios do Talmud vão mais longe que isso, declarando que há um nível no qual a vida se estende para além da morte, sem interrupção. "Moshê não morreu," declaram categoricamente; "Nosso pai Yaacov não morreu," apesar do fato de que os encomiastas elogiaram, os embalsamadores embalsamaram, e os coveiros sepultaram." A menos que se interprete estas declarações de modo alegórico, Rashi (Rabi Shelomô Yitschaki, 1040-1105, o mais notável dos comentaristas bíblicos e talmúdicos), explica: "Ele lhes parecia morto, mas na verdade estava vivo."

     
 
     
 

O mestre chassídico Rabi Schneur Zalman de Liadi explica que a vida, como a conhecemos, de fato pode sobreviver à morte; a questão é apenas que tipo de vida conhecemos antes da morte.

Quando você se sente mais vivo? O que é a vida para você - uma boa xícara de café, o odor do pão assando, um passeio no parque em um dia banhado de sol? Ou é a experiência de ver um projeto no qual trabalhou por meses finalmente se concretizar, ou quando você se esforça para explicar algo a seu filho e subitamente vê a luz da compreensão brilhando em seus olhos?

Os prazeres da vida são muitos e variados, mas podem ser divididos em duas categorias principais: a satisfação de um desejo ou necessidade pessoal, ou causar um certo impacto nas vidas dos outros. O primeiro tipo oferece muitos momentos gratificantes, mas nada pode se igualar à realização que vem quando você faz a diferença na vida de outras pessoas, quando o mundo torna-se diferente - melhor, mais sábio, mais sagrado - por causa de algo que você fez.

A primeira categoria cessa com a interrupção da vida física. Se você está morto e enterrado, não há mais passeios no parque. Porém seu impacto no mundo continua. Se você ensinou algo a alguém, aquela pessoa agora o está ensinando a uma outra pessoa. Se você agiu bondosamente com alguém, a pessoa ainda se sente bem a respeito daquilo, ou é um ser humano melhor por causa disso, e está agindo de forma mais bondosa com outros. Se você fez do mundo um local melhor, este melhoramento agora está sendo aperfeiçoado para tornar o mundo um lugar ainda melhor.

Então "a vida como a conhecemos" se estende além da morte? Isso depende daquilo que considera vida. Se a vida, para você, é conseguir o máximo que puder de seus recursos para si mesmo, você tem um tempo limitado no qual conseguir o máximo que puder, e então fecham-se as cortinas e acaba o espetáculo. Se vida, para você, significa fazer uma diferença na vida do próximo, então você viverá para sempre.

     
 
     
 

Esta é a mensagem da leitura de Chayê Sará da Torá, na qual "A Vida de Sará" ocorre após sua morte. Ostensivamente, os eventos de Chayê Sará enfatizam o fato de que Sará não é mais; entretanto, na verdade proclamam que Sará está viva.

Juntamente com Avraham, Sará foi pioneira no assentamento judaico da Terra de Canaan; como está descrito no capítulo introdutório de Chayei Sará, seu sepultamento na Gruta de Machpelá representou a primeira posse real de um pedaço de solo na Terra Santa. Sará devotou sua vida à criação da primeira família judia; a história da escolha de Rivca demonstra como a sucessora de Sará personificou os ideais sobre os quais Sará fundou o lar judaico. Mesmo o retorno de Hagar expressa a extensão do impacto de Sará na história judaica; o banimento de Hagar e Ishmael feito por Sará foi para remover uma ameaça à integridade de Yitschac como herdeiro de Avraham. A volta de Hagar, como descrita nos versículos de encerramento de Chayê Sará, conseguem exatamente aquilo - estabelecer Yitschac como aquele que manteve viva a tocha do legado de Avraham.

Dessa maneira, o nome Chayê Sará expressa a verdadeira importância desta porção da Torá. De fato, nenhuma das porções anteriores da Torá que relatam os eventos da vida de Sará antes da morte podem merecer o nome "A Vida de Sará." Descrevem o que, por si mesma, pode ser vista como uma vida temporal - uma vida com início e fim, uma vida confinada a um corpo específico, com uma duração específica. O verdadeiro Chayê Sará vem à luz nos fatos que se seguiram à sua morte, quando a eternidade de sua vida é revelada.

     
   
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