|
"Pois
o Senhor teu D’us está te levando a uma boa terra: …
Uma terra de trigo, cevada, uvas, figos e romãs: uma terra de oliveiras
que emana azeite e [tâmara] mel." (Devarim 8:8)
Nossos sábios nos contam que, originalmente, todas as árvores
tinham frutos, como também será o caso na Era de Mashiach.
Uma árvore sem frutos é sintoma de um mundo imperfeito,
pois a principal função de uma árvore é produzir
frutos.
Se "o homem é uma árvore do campo" e o fruto é
a maior realização da árvore, há sete frutos
que coroam a colheita humana e botânica. Estes são os sete
frutos e grãos destacados pela Torá como exemplares da fertilidade
da Terra Santa: trigo, cevada, uvas, figos, romãs, azeitonas e
tâmaras.
O 15º dia do mês hebraico de Shevat é o dia designado pelo
calendário judaico como o "Ano Novo das Árvores."
Neste dia, celebramos as árvores do mundo de D’us, e a árvore
dentro de nós, partilhando destes sete "frutos," que
exemplificam os vários componentes e modos de vida humana.
Comida e forragem
Os mestres cabalistas nos dizem que cada um de nós tem não
uma, mas duas almas: uma "alma animalesca," que incorpora nossos
instintos naturais, egoístas: e uma "alma Divina" incorporando
nossos desejos transcendentais – nosso desejo de escapar do "Eu"
e relacionar-se com aquilo que é maior que nós mesmos.
Como o nome sugere, a alma animalesca constitui aquela parte de nós
mesmos que é comum a todas as criaturas vivas: o instinto de autoconservação
e perpetuação da própria espécie. Porém
o homem é mais que um animal sofisticado. Existem qualidades que
são exclusivamente nossas, como seres humanos – as qualidades
que derivam de nossa "alma Divina." O ponto no qual nós
nos graduamos além do "eu" e suas necessidades ("Como
faço para sobreviver?" "Como obter alimento, abrigo,
dinheiro, poder, conhecimento, satisfação?") a uma
perspectiva supra-"eu"("Por que estou aqui?" "Qual
é meu objetivo?") é o ponto no qual deixamos de ser
apenas outro animal no mundo de D’us, e começamos a perceber
nossa singularidade como seres humanos.
Isso não é dizer que o "eu" animal deve ser rejeitado
em favor do "eu humano-Divino. Estas são nossas duas almas,
ambas indispensáveis a uma vida de realização e propósito.
Mesmo quando estimulamos o Divino dentro de nós para nos elevar
acima do meramente animal, devemos também desenvolver e refinar
nosso "eu" animal, aprendendo a cultivar os aspectos construtivos
do próprio "eu": (ex. autoconfiança, coragem,
perseverança) enquanto eliminamos o egoísta e o profano.
Na
Torá, o trigo é considerado o esteio da dieta humana, ao
passo que a cevada é mencionada como um alimento tipicamente animal
(cf. Tehilim 104:5 e I Melachim, 5:8. Veja também o Talmud, Sotah
14a). Assim, o "trigo" representa o esforço para nutrir
o que há de distintamente humano em nós, alimentar as Divinas
aspirações que são a essência de nossa humanidade.
A "cevada" representa o esforço para nutrir e desenvolver
nossa alma animalesca – uma tarefa não menos crucial para
nossa missão na vida que o cultivo de nossa alma Divina.
Empolgação
Trigo e cevada, os dois grãos dentre as Sete Espécies, representam
a "matéria-prima" de nossa composição interior.
Depois destes vêm os cinco frutos – "aperitivos"
e "sobremesas" em nosso cardápio espiritual – que
adiciona sabor e estímulo ao nosso esforço básico
de desenvolver nossas almas, a animalesca e a Divina.
O
primeiro desses é a uva, cuja característica principal é
a alegria. Como a videira descreve seu produto na Parábola de Yotam
(Shofetim 9:13), "… meu vinho, que faz felizes D’us e
os homens."
A alegria é revelação. Uma pessoa influenciada pelo
júbilo tem os mesmos traços básicos que possui em
um estado não-jubiloso – o mesmo conhecimento e inteligência,
os mesmos amores, ódios e desejos. Mas em um estado de felicidade,
tudo é mais pronunciado: a mente é mais arguta, o amor mais
profundo, os ódios mais vívidos, os desejos mais agressivos.
As emoções que normalmente mostram apenas uma pálida
imagem de sua verdadeira extensão, agora tornam-se mais ostensivas.
Nas palavras do Talmud, "Quando entra o vinho, o oculto se revela."
Uma vida sem alegria poderia estar completa de todas as maneiras, porém
é uma vida superficial; tudo está ali, mas apenas a superfície
nua é mostrada. Tanto a alma animalesca quanto a Divina contêm
vastos reservatórios de percepção e sentimento que
jamais vêem a luz do dia porque não há nada para estimulá-los.
A "uva" representa o elemento de júbilo em nossa vida
– a alegria que desencadeia estes potenciais e adiciona profundidade,
cor e intensidade a tudo que fazemos.
Envolvimento
Podemos estar fazendo algo total e completamente; podemos mesmo estar
fazendo isso alegremente. Mas estamos ali? Estamos envolvidos?
Envolvimento significa mais que fazer alguma coisa certa, mais que dar
tudo de nós. Significa que nos importamos, que estamos investidos
na tarefa. Significa que somos afetados por aquilo que fazemos, para o
melhor e para o pior.
O
figo, a quarta das "Sete Espécies," é também
o fruto da "Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal" –
o fruto que Adão e Eva provaram, cometendo assim o primeiro pecado
da história. Como explica o ensinamento chassídico, "conhecimento"
(daat) implica um envolvimento íntimo com a coisa conhecida (como
no versículo "E Adão conheceu sua mulher"). O
pecado de Adão derivou de sua recusa em reconciliar-se com a noção
de que há certas coisas das quais ele deveria se distanciar; ele
desejava conhecer intimamente cada canto do mundo de D’us, tornar-se
envolvido com cada uma das criações de D’us. Mesmo
o mal, mesmo aquilo que D’us tinha declarado fora do alcance dele.
O figo de Adão foi uma das forças mais destrutivas da história.
Em seu igualmente poderoso disfarce construtivo, o figo representa nossa
capacidade para um envolvimento profundo e íntimo em nosso próprio
esforço positivo – um envolvimento que significa que somos
um com aquilo que estamos fazendo.
Ação
"Seus
lábios são como um fio de escarlate" exaltou Salomão
em sua celebração do amor entre o Noivo Divino e Sua noiva
Israel: "Sua boca é graciosa: sua têmpora é como
um pedaço de romã em seus cachos" (Shir HaShirim, Cântico
dos Cantos 4:3). Conforme interpretada pelo Talmud, a alegoria da romã
expressa a verdade que: "Mesmo os vazios dentre vocês estão
repletos de boas ações, como uma romã [está
repleta de sementes]."
A romã é não somente um modelo para algo que contém
muitos detalhes. Fala também do paradoxo de como um indivíduo
pode ser "vazio" e, ao mesmo tempo, estar "repleto de boas
ações como uma romã."
A romã é uma fruta altamente dividida em compartimentos:
cada uma de suas centenas de sementes está envolvida em seu próprio
saco de polpa, e separada de suas iguais por um membrana rija. Da mesma
maneira, é possível para uma pessoa fazer boas ações
: muitas boas ações – mesmo assim elas permanecem
como atos isolados, com pouco ou nenhum efeito sobre sua natureza e caráter.
Ela pode possuir muitas virtudes, mas elas não se tornam ela; ela
pode estar repleto de boas ações, mesmo assim permanece
moral e espiritualmente superficial.
Se o figo representa nossa capacidade para envolvimento total e identificação
com aquilo que estamos fazendo, a romã é a antítese
do figo, representando nossa capacidade de superar a nós mesmos
e agir de maneira a ultrapassar nosso estado espiritual interno. É
nossa capacidade de fazer e conseguir coisas que são totalmente
incompatíveis com quem e o quê somos no momento atual.
A romã é a "hipocrisia" em sua forma mais nobre:
a recusa de se reconciliar com a estação moral e espiritual
de alguém, conforme definido pelo estado atual do caráter
da pessoa; a insistência em agir melhor e mais Divinamente que aquilo
que somos.
Luta
Para
a maioria de nós, "vida" é sinônimo de "luta."
Lutamos para forjar uma identidade sob a sombra pesada da influência
de nossos pais e amigos; lutamos para encontrar um parceiro para a vida,
e depois lutamos para preservar nosso casamento; lutamos para criar nossos
filhos, e depois lutamos em nosso relacionamento com eles quando adultos;
lutamos para ganhar o sustento, e depois lutamos com nossa culpa pela
boa sorte que tivemos; e subjacente a isso tudo, está o eterno
conflito entre nosso "eu" animalesco e Divino, entre os instintos
egoístas e nossas aspirações para transcender o "eu"
e tocar o Divino.
A "oliveira" em nós é aquela parte que se esforça
na luta, que se revela, que não escaparia mais dela que da própria
vida. "Bem como uma azeitona," dizem nossos sábios, "que
fornece seu azeite quando prensada," assim, também, nós
cedemos o que há de melhor dentro de nós quando pressionados
pelos moinhos da vida e as forças opostas de um "eu"
dividido.
Perfeição
Como
o "figo" é contrabalançado pela "romã,"
assim também a "azeitona" em nós contrasta com
nosso sétimo fruto, a tâmara, que representa nossa capacidade
para a paz, a tranqüilidade e a perfeição. Embora seja
verdade que somos melhores quando pressionados, é igualmente verdade
que há potenciais em nossa alma que brotam apenas quando estamos
completamente em paz conosco – somente quando conseguimos um equilíbrio
e harmonia entre os diversos componentes de nossa alma.
Assim canta o Salmista: "O tsadic (pessoa completamente justa) vicejará
como a tamareira (Salmos 92:13). O Zohar explica que há uma determinada
espécie de tamareira que demora setenta anos para frutificar. O
caráter humano é composto de sete atributos básicos,
cada um consistindo de dez sub-categorias; assim, o florescer do tsadic
"após 70 anos" é o fruto da absoluta tranqüilidade
– o produto de uma alma cujos aspectos e nuances de caráter
foram refinados e harmonizados consigo mesmo, com o próximo e com
D’us.
Embora a azeitona e a tâmara descrevam duas personalidades espirituais
muito diferentes, ambas existem dentro de cada homem. Pois mesmo em meio
a nossas lutas mais ardentes, sempre podemos encontrar conforto e fortaleza
na tranqüila perfeição que habita o íntimo de
nossa alma. E mesmo em nossos momentos mais tranqüilos, sempre podemos
encontrar o desafio que nos levará a realizações
ainda maiores.
|