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Ao
entrar no beit midrash às 4h37 da manhã, Shlomo foi simultaneamente
dominado pelo forte aroma de café e o barulho de centenas de pessoas
estudando Torá com toda a força de seus pulmões.
O aposento simplesmente pulsava de atividade. Ele passou pelo labirinto
de pessoas, e colocou um volume doTalmud próximo a seu terceiro
copo de chá, e inclinou-se para puxar seu assento de sob a mesa.
Quando sua mão agarrou as cotas da cadeira de plástico branco
ele lembrou-se da regra da noite – sentar significa dormir. Voltou
a cadeira ao lugar e moveu-se para a esquerda, em direção
a uma estante de madeira. Ele e mais outros 200 tinham estado estudando
de propósito no beit midrash desde as 9 horas da noite anterior
– mais que sete horas sem parar – e ainda tinham duas horas
até o nascer do sol. Embora estivesse exausto, Shlomo sentiu-se
determinado a mergulhar naquele texto talmúdico até o dia
clarear. A cafeína forneceria um impulso artificial de energia
(e pressão sangüínea) mas finalmente, Shlomo percebeu
que seu desejo de aprender, sua perseverança, traria a longa noite
a um final bem-sucedido.
Assim como Shlomo, dezenas de milhares de judeus no mundo todo passarão
a noite de Shavuot inteira estudando Torá. A experiência
de aprender por toda a noite serve realmente como modelo para o ano todo:
D’us ordena: "Este livro da Torá não é
para sair de tua boca; deves contemplá-lo dia e noite" (Yehoshua
1:8). Isso se traduz em uma das mitsvot mais abrangentes. Um judeu deve
estabelecer tempo todos os dias para o estudo de Torá – de
forma ideal, bastante tempo – e, independente do número de
horas, a Torá deve permanecer como o supremo objetivo de um judeu.
D’us exige nossa máxima dedicação de tempo
e energia à busca da verdade através da Torá, pois
quanto mais esforços fizermos para estudar a Torá, mais
ela torna-se uma parte de nós, e mais se fortalece nosso relacionamento
com o Criador.
Em Pirkê Avot (2:17) Rabi Yossi nos galvaniza, dizendo: "Prepare-se
para aprender Torá, pois não é [atingida sem esforço]
por você [como] um legado.."
Quanto mais trabalharmos para aperfeiçoar nosso caráter
e quanto mais diligentemente procurarmos as profundezas do conhecimento
de Torá, mais nossos esforços serão recompensados
neste mundo e no vindouro.
Rabino Chaim de Volozhin enfatiza este conceito citando duas fontes que
parecem contradizê-lo. Ao abençoar o povo judeu antes de
sua morte, Moshê descreve a Torá como sendo "a eterna
herança para a congregação de Israel" (Devarim
33:4).
A palavra hebraica "morashá', que significa legado, sugere
também herança, algo que vem automaticamente e sem esforço.
Isso poderia sugerir que há uma garantia de sucesso automático
no estudo e crescimento de Torá. Similarmente, o Talmud registra
que para qualquer família com três gerações
de eruditos de Torá, D’us garante que a cadeia de erudição
de Torá continuará nas futuras gerações, como
o Talmud sumariza homileticamente: "A Torá sempre retorna
ao alojamento que lhe é familiar." Esta família deu
as boas vindas à Torá por três gerações,
portanto, da mesma forma, a Torá torna-se um freguês fiel
que volta. Entretanto, embora isso possa parecer muito bom, é consistente
com a passagem em Pirkê Avot, que declara que o conhecimento de
Torá somente pode ser conseguido através de busca diligente?
Rabi Chaim responde que a passagem em Pirkê Avot foi cuidadosamente
elaborada para dispersar a falsa noção de que a Torá
pode ser conseguida sem esforço. Devemos traduzir este versículo
de maneira mais precisa: D’us promete que a Torá é
o legado do povo judeu, a "congregação de Israel",
e sempre existirá no meio deles como uma entidade viva e dinâmica.
Porém cada indivíduo deve provar-se merecedor de sua aquisição.
Da mesma forma, devemos seguir a analogia feita pelo Talmud até
sua conclusão lógica: A Torá retornará como
um hóspede fiel a seu alojamento já conhecido, com a família
de eruditos de Torá. Entretanto, como bem sabe o gerente de qualquer
hotel, se a tinta está descascando nas paredes e os quartos cheiram
a mofo e não são convidativos, os clientes logo perderão
sua lealdade e não voltarão mais. Finalmente, cabe ao indivíduo
demonstrar que merece continuar a tradição de erudição
e piedade estabelecida pelo seu pai, avô e bisavô. Apenas
então ele será merecedor e a história de sua família
se realizará.
Crescimento na Torá é a conquista mais significativa e mais
duradoura que um judeu pode atingir, e quanto mais esforço dedicarmos
a isso, mais receberemos em retorno. De fato, em Shavuot e em todas as
outras noites, a este respeito, é nossa obrigação
e privilégio dedicarmo-nos ao desenvolvimento pessoal através
da Torá, um legado eterno ao povo judeu. |